NOTA INTRODUTÓRIA À CORRESPONDENCIA
Louis Cattiaux-René Guénon
Ao longo de três anos (19 de outubro de 1947 – 10 de outubro de 1950), Louis Cattiaux[1] e René Guénon[2] mantiveram uma relação epistolar do maior interesse para os buscadores de Deus.
Esta relação se estabeleceu a partir da publicação d’ A Mensagem Reencontrada, em 1946 (com somente 12 livros ou capítulos). No ano seguinte, L. Cattiaux escreveu a R. Guénon para pedir-lhe que escrevesse uma resenha de seu livro, ao qual concordou. Foi publicada na revista Études Traditionelles, em setembro de 1948.
Através de sua relação epistolar, cada um deles descobriu que seu correspondente era, como ele, um homem da Tradição. René Guénon e Louis Cattiaux eram representantes radicais e insubornáveis que tinham apostado tudo em uma só carta, pelo que nasceu entre eles uma empatia e certa comunhão de ideias, até o ponto que – coisa de todo inusual – o auto exilado do Cairo convidou o singular alquimista Louis Cattiaux a visitá-lo. Só uns poucos tinham este privilégio, pois Guénon havia cortado todo contato com o Ocidente.
O conceito que os dois tinham do mundo moderno era muito similar, e todas as taras de nossas sociedades atuais já as denunciavam naqueles anos: sua inversão, sua banalidade, o materialismo utilitarista e mercantilista, a progressiva aceleração da vida, a falsificação generalizada, o pseudo-orientalismo, o caos crescente, a desumanização, o processo de artificialização da vida, etc.
Talvez, R. Guénon intuiu que n’ A Mensagem Reencontrada se ocultava a Tradição primordial revivida, como uma luz oculta nas palavras do livro. Por ser um texto vivo inteiramente consagrado à revelação dos mistérios da regeneração espiritual e corporal do ser humano, é lógico que o auto exilado do Cairo perceberia, com seu fino olfato, que a obra não era “literatura de autor”, senão o fruto de uma inspiração fora do comum.
No entanto, entre ambos havia certas dissensões doutrinais, pois o sufismo islâmico que vivia Guénon nem sempre concordava com o hermetismo radical de Cattiaux. Este, ainda que se mostrasse particularmente pedagógico, não pode revelar os mistérios em uma carta ou varias cartas, pois como explicar com palavras deste mundo que Deus aniquila o homem para depois reconstruí-lo? Como falar da separação interior entre o puro e o impuro que se realiza nele? Como descrever o corpo de luz oculto no corpo de carne mortal? Como é possível ter na mão a Matéria de Deus?
O leitor lerá com proveito esta rica correspondência, e cada qual extrairá dela o que mais o instrua e reconforte (vê-se em CARTAS – Correspondências entre Louis Cattiaux e René Guénon, neste site).
[1] Louis Cattiaux nasceu em Valenciennes, em 17 de agosto de 1904 e morreu em Paris, em 16 de julho de 1953.
[2] René Guénon nasceu em Blois, em 15 de novembro de 1886 e morreu no Cairo, em 7 de janeiro de 1951.
Paris-Cairo – correspondência entre Louis Cattiaux e René Guénon de 1947 a 1950
À Marguerite Goupy, que retornou à Casa do Pai em 20 de setembro de 2011 Em homenagem ao seu apoio generoso ao Miroir d’Isis Tradução
Paris-Cairo – correspondência entre Louis Cattiaux e René Guénon de 1947 a 1950 (cont.)
Tradução do francês: Marina Coelho Ungaretti Louis Cattiaux Paris, 5 de janeiro de 1948 Senhor, Fico honrado de saber que o senhor se interessou suficientemente